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Caju amigo

 

RIO DE JANEIRO - Esta será a segunda ou a terceira vez que elogiarei o presidente da República. Ao longo do primeiro mandato e neste início do segundo, um dos meus temas prediletos foi criticá-lo -algumas vezes com alguma, e talvez injusta, veemência. Mas não resisti à sua foto exibindo um bonito caju, que se adivinha gordo e sumarento. Depois de lançar o Fome Zero e o Bolsa Família, promover uma cruzada de redenção para o caju é salutar, embora não seja necessário.


Para falar a verdade, não morro de amores pelo caju, embora aprecie uma cajuada feita a preceito. Gilberto Freyre e Humberto de Campos, um sob o ponto de vista sociológico, outro sob o aspecto literário, deixaram páginas admiráveis sobre a fruta, que tem realmente um gosto de Brasil.


Os primeiros visitantes que aqui chegaram deliciaram-se com a bebida que os índios ofereciam aos estrangeiros. Tratava-se de um refresco espumante, artesanal. O caju era mastigado pacientemente e cuspido numa bacia de barro. A massa ficava três dias ao relento, para a devida fermentação, mal comparando, como certos vinhos, que passam anos para se transformar em champanhe. O gosto -diziam- era melhor do que o do hidromel, a bebida servida aos deuses no Olimpo.


Há métodos modernos para obter fermentação mais adequada ao nosso gosto civilizado. Por tudo isso, louvo o presidente e sua foto contemplando com carinho um gordo e nutritivo caju. Seria mais simbólico, e condizente com o tempo que atravessamos, se ele estivesse segurando um abacaxi ou um pepino. Não colaria bem na sociedade o presidente da República patrocinar uma cruzada pelo abacaxi ou pelo pepino, que, aliás, não precisam de patrocínio nem de cruzada cívica para entrarem na pauta dos apetites nacionais.


Folha de S. Paulo (SP) 30/8/2007