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O precioso líquido

 

Quando o assunto é corrupção, o exemplo mais banal que nos ocorre é o de Al Capone. Ele só foi punido por uma questão do imposto de renda. Seus múltiplos crimes, incluindo assassinatos, não deixavam pistas -ele chegava a ser um perfeccionista, sabia o que fazia.

Parece exagero citar Al Capone no caso que envolveu o Palocci. Mas a comparação é às avessas. Por falta de transparência nas declarações do ex-ministro, ninguém podia acusá-lo de algum crime, a não ser de improbidade administrativa, como deixou em aberto o parecer do procurador-geral da República, ao arquivar o processo.

Toda a contabilidade da empresa de Palocci (segundo a Procuradoria) está enquadrada nas leis em vigor. Ao contrário de Al Capone, a empresa pagava taxas e impostos.

Como empresário, ele cumpriu o seu papel: prestou consultoria no mercado, cumpriu as leis existentes e mantém o sigilo de suas fontes, quer dizer, dos clientes aos quais prestou serviços técnicos.

Acontece que houve uma superposição de funções. O esclarecido consultor, que abasteceu seus clientes de informações, é deputado e chefiou a equipe de transição dos governos Lula e Dilma. Na realidade, montou o governo.

Era o manobrista da água que abastece determinadas ruas e bairros: fechando ou abrindo registros, determina onde haverá falta ou abundância do decantado "precioso líquido".

Foi justamente esse "precioso líquido" que deu a Palocci um escandaloso faturamento empresarial. Em escala menor, dona Erenice, ex-braço direito e sucessora de dona Dilma na Casa Civil, também usou das regalias do precioso abastecimento e foi afastada por tráfico de influência. Seria bom a nossa presidente esquecer o braço direito e usar mais o esquerdo.

Folha de São Paulo, 9/6/2011