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Trotes eletrônicos

 

Quando o uso do telefone tradicional tornou-se comum, ao alcance de quase todos, os mais conservadores temeram que a privacidade de cada um ficasse ameaçada. Afinal, com o número do aparelho num catálogo geral podia-se penetrar na intimidade do lar, da empresa, na vida de todos.


Houve época em que os trotes eram frequentes. Quem não tinha muito o que fazer pegava o telefone, discava um número qualquer, xingava a mãe do sujeito, acusava a mulher de adultério, cobrava uma dívida inexistente.


Lembro um sujeito que, nos anos 40, deu um tiro no seu telefone porque um gaiato ligava todos os dias para cobrar maior vigilância sobre a mulher, que, segundo a voz anônima, era uma galinha.


Com o computador começou a haver não apenas o trote, mas a informação ociosa, poluidora da telinha. Ofertas de dinheiro fácil, de mulheres também fáceis, em épocas eleitorais a agenda dos candidatos pelos grotões do Brasil afora, campanhas mirabolantes disso e daquilo, um mundão de propostas que não interessam a ninguém.


Há também trotes, encontros que não se realizam, convites falsos, denúncias de falências, de corrupção, de pedofilia, que agora entrou na moda.


Certa vez, fiquei sabendo que um cidadão famoso havia morrido e fora sepultado no São João Batista às escondidas. Empresário importante no mercado, sua morte não podia ser divulgada. Teriam arranjado um sósia, que ocupou seu lugar na família, na empresa e na sociedade.


Tempos atrás, recebi uma oferta de um apicultor que me queria vender uma colméia de abelhas. Nos meus delírios mais extravagantes, já pensei em chegar a papa, a ser barítono do Metropolitan, a craque do Real Madrid. Mas Deus é testemunha de que nunca pensei em mexer com abelhas.


Folha de S. Paulo, 18/5/2010