O senhor começou a publicar ainda jovem, com “Ária de bolso” (1971). Que inquietações ou motivações o levaram à poesia e como o senhor vê hoje esse primeiro livro?
A motivação é o escritor pensar, nem sempre com razão, que tem algo a contribuir para a literatura de seu tempo. Reeditei algumas vezes esse livro de estreia, em versões cada vez mais reduzidas. Era um livro que apontava em várias direções, do medievalismo à poesia concreta. Algumas delas eu segui, a maioria abandonei.
Sua obra crítica sobre João Cabral de Melo Neto é amplamente reconhecida. O que mais lhe fascina na construção poética de Cabral e como essa admiração moldou sua própria escrita?
Tenho em comum com o poeta a atenção obsessiva na construção do texto, mas com encaminhamentos bem diferentes. Costumo dizer que estudei muito Cabral para, como criador, compreender em minúcias tudo aquilo que não devo fazer, pois já foi admiravelmente feito por ele.
Como o senhor equilibra o papel de poeta e crítico? Essas duas facetas se complementam ou, por vezes, entram em conflito?
Ambos se correspondem sem maior conflito, na medida em que exerço vigilância crítica severa na minha poesia, e tento injetar algum sopro poético em meu ensaísmo.
Durante décadas, o senhor foi professor titular de Literatura Brasileira na UFRJ. Que desafios e alegrias marcaram sua trajetória docente?
O desafio foi incorporar a poesia à cesta básica de cultura de meus alunos, não sei com que grau de sucesso. Mas empenho e entusiasmo não faltaram, creio.
Desde sua eleição para a ABL em 2004, como avalia o papel da Academia na preservação e difusão da literatura brasileira contemporânea?
A Academia exerce papel extraordinário não só na preservação de nossa memória cultural, como também na abertura a questões da contemporaneidade. Pena que seja pouco, e às vezes equivocadamente, conhecida, frente ao tesouro de informações disponível no seu site, http://www.academia.org.br.
Sua poesia dialoga com a tradição sem deixar de ser contemporânea. Como o senhor encara a tensão entre o clássico e o moderno no fazer poético?
Dialogo com os clássicos não para repeti-los – às vezes, a tonalidade desse discurso é irônica. Desconhecê-los pode levar à repetição involuntária; não me parece que a ignorância tenha produzido muita coisa relevante em termos de poesia.
Como avalia o espaço atual da crítica literária no Brasil, sobretudo em tempos de redes sociais e consumo rápido de conteúdo?
Muita leitura rápida para leitores velozes. Mais releases do que crítica.
O senhor poderia compartilhar conosco quais são os seus projetos literários em andamento, seja na poesia, na crítica ou em outras áreas?
Gavetas praticamente vazias com a publicação simultânea, pela Editora da UNESP, de Papéis de prosa – Machado & mais e Papéis de poesia II. Agora, pretendo me dedicar a um novo livro de poemas – o anterior é de 2017 – e continuar trabalhando na coordenação de projetos da Academia Brasileira de Letras.
Que mensagem deixaria aos leitores que desejam se aproximar mais da literatura? E como os interessados podem acompanhar sua produção e atividades?
Não esquecer o que disse Mallarmé: “Tudo no mundo existe para acabar num livro”. Acrescento: não só para acabar, mas para renascer. Quanto à minha produção, dou notícias na rede social em que sou bastante ativo, o Facebook. Alguns queridos alunos criaram o grupo Secchin Poeta e Professor.
Entre lembranças, reflexões e novos planos, fica claro que sua relação com a literatura continua pulsante e generosa. Seja na poesia, na crítica ou na docência, sua obra convida leitores a pensar, dialogar e descobrir novos caminhos nas palavras. Afinal, como ele mesmo lembra, a literatura não se encerra em um livro: renasce sempre que alguém abre suas páginas.
Matéria na íntegra: https://entrepoetasepoesias.com.br/2025/08/31/literatura-como-heranca-e-reinvencao-conversa-com-antonio-carlos-secchin/
01/09/2025