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Flta de criatividade

 

Não fui eu. Foi o presidente da República quem falou em golpismo. Tentou amedrontar a nação que já vive amedrontada, não pela possibilidade de um golpe, mas por não saber até onde o mar da corrupção arrastará a nação.


Por maior e mais provada que seja a corrupção, ela não provoca revoluções nem golpes. Por mais enojada que a sociedade esteja em matéria de honestidade e moral, ela reconhece que tem telhado de vidro. Embora protestando por todos os trombones e alto-falantes, acaba tolerando a corrupção, considerando-a inerente ao ser humano em particular e à própria sociedade em geral.


O que provoca os golpes e as revoluções é uma idéia. O mundo não combateu Hitler porque ele era corrupto. Danton foi parar na guilhotina - ele nem estava ali para condenar a corrupção da monarquia, lutou e morreu por uma idéia. Seu rival mais ostensivo não era um corrupto e foi também parar na guilhotina, apesar de ser chamado de "incorruptível", como Felipe foi o Belo, Pepino foi o Breve e dom Manoel foi o Venturoso.


Evidente que a corrupção serve de pretexto para justificar a ruptura com determinada legalidade institucional. Trata-se de um apelo para comprometer a plebe e a mídia. O que realmente importa é a idéia que se deseja impor em substituição a outra. Causa pela qual valerá a pena matar ou morrer.


No momento atual, quando a corrupção se instalou em vários escalões públicos, estão todos (corruptos ou não) do mesmo lado, com as mesmas idéias de liberalismo, democracia representativa, justiça social etc. Em 8.000 anos de história, não se criou, nem aqui nem no resto do mundo, uma idéia nova de como gerir o Estado em benefício do ser humano. Ditadura e anarquia são mais nefastas do que a democracia. Tivemos criatividade para inventar o barbeador elétrico, o telefone sem fio, a pizza de quatro queijos. Faltou-nos até agora criatividade para fazermos uma sociedade melhor.




Folha de São Paulo (São Paulo) 18/12/2005

Folha de São Paulo (São Paulo), 18/12/2005