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Saudades do mata-mosquito

 

O RIO ERA, no século 19, uma cidade insalubre, sujeita a epidemias que se repetiam com freqüência. Para piorar a situação, o porto recebia marinheiros contaminados, que traziam pestes.


O corpo diplomático não desejava residir nela, acompanhando Rio Branco, que, com medo de doença, morava em Petrópolis. O próprio presidente Rodrigues Alves vivia a maior parte do tempo em Guaratinguetá, sua cidade natal, também receoso das epidemias, o que não o defendeu de uma delas, a gripe espanhola, da qual morreu em 1919.


Afonso Arinos diz em sua biografia: "A morte reinava sobre a extensa capital [Rio], e ela aparecia à imaginação dos brasileiros e estrangeiros como uma enferma miserável, entendida em um luxuoso leito natural".


Rodrigues Alves fez tudo para torná-la saudável. Nomeou Pereira Passos prefeito, para fazer as obras urbanas, cais, canais coletores de alagados, avenidas que deram à cidade um aspecto aberto e agradável, e Oswaldo Cruz para comandar a política sanitária. Na palavra de Luis Edmundo, "a cidade chiqueiro foi transformada em cidade maravilhosa".


As epidemias que infestavam a cidade eram de peste, de cólera, de varíola, de febre amarela, de malária e de infecções intestinais, pela poluição das águas potáveis.


Em 1909, Oswaldo Cruz zerou a morte por febre amarela. Em 1958, a Organização Pan-Americana de Saúde confirmou a erradicação do Aëdes aegypti no Brasil, mas ele reapareceu em 67, no Pará, e chegou em 77 ao Rio. Tivemos uma primeira epidemia de dengue nessa nova fase em 1986-1987.


Em 1970, foi formada a Sucam (Superintendência de Campanhas de Saúde), que reorganizou os mata-mosquitos, criados e existentes desde o tempo de Rodrigues Alves (1903), espalhados pelo Brasil inteiro, visitando as residências, furando as latas, fazendo limpeza dos depósitos de água e borrifando as casas com inseticidas, para eliminar os focos de mosquitos.


Em 1990, a Sucam foi extinta.


Por coincidência ou não, no mesmo ano, os casos de dengue passaram de 100 mil para atingir 360 mil em 98 e 430 mil no ano passado. A epidemia do Rio de Janeiro está sendo mais visível porque é a mais importante cidade do Brasil e a taxa da mortalidade é grande. Mas o mesmo acontece no silêncio sofredor das capitais da Amazônia e do Nordeste.


Por que não voltar o mata-mosquito, um exército vitorioso? É saudosismo? Pode ser. Mas deu certo. Apresentei essa sugestão ao governador Sérgio Cabral e espero que o presidente Lula estude esta hipótese. Ela não será transitória nem só para este momento, mas permanente defesa da saúde do povo brasileiro.


Folha de S. Paulo (SP) 11/4/2008