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Um bom começo de Quaresma

 

O ano de 2005 entrou a pleno vapor. Saímos do Réveillon, atropelamos os Santos Reis e logo ouvimos os tambores dos terreiros de são Sebastião, que vinham misturados com os tamborins de um Carnaval bem curtinho, frenético e acelerado. Num relâmpago, já batemos nas Cinzas, com o véu da Quaresma, sem sair da folia que se prolonga até sábado na Barra, em Salvador, e, no Maranhão, com o lava-pratos, que é um domingo da Quaresma gordo em são José de Ribamar, santo padroeiro do Estado, onde os foliões vão pedir perdão pelos pecados pecando mais. Conheci um velho tio que recomendava aos filhos sobre as folias de Momo: "Tenha muito juízo e comporte-se mal".


O melhor do meu Carnaval foi abrir os jornais na Quarta-Feira de Cinzas e ler que, numa reunião no Cairo, israelenses e palestinos tinham acertado um cessar-fogo.


Quem mais se esforçou por esse acordo foi o ex-presidente Bill Clinton. Com grande determinação, levou Barak, então primeiro-ministro de Israel, a todas as concessões, que acabaram com seu futuro político. Ele tinha sido eleito pelo desejo do povo judeu de sair dessa exaustiva e inquietante guerra. E Barak era a perspectiva dessa solução contra os falcões da guerra. Tudo foi frustração, mas Barak teve coragem.


Infelizmente, Iasser Arafat não teve a mesma coragem como aquela de Sadat, que imolou sua vida para que sua pátria pudesse desfrutar do direito de viver tranqüilamente. Clinton tentou desesperadamente convencer Arafat que as grandes causas têm risco. Com o fracasso das negociações, ficou apenas a obstinação de Clinton e a morte política de Barak.


A Intifada recomeçou. A opinião pública israelense mudou e apegou-se a uma tábua velha, Ariel Sharon, que só acreditava na violência e na força. Arafat passou os últimos anos de sua vida sitiado, saindo apenas para morrer. O terrorismo saiu dali para o mundo inteiro, a começar pelos Estados Unidos, com o atentado brutal às Torres Gêmeas.


Depois é o que sabemos. Veio o Afeganistão, o Iraque e ninguém sabe onde está o caminho da saída. Não nos surpreenderemos se o Irã entrar nesse alvo.


Acredito que a vitória sobre o terrorismo comece pela paz entre israelenses e palestinos.


Imensas dificuldades cercam essa negociação. Ela será feita de obstinação e de visão de futuro. O que era de Arafat -velha visão- paira sobre Sharon, que ficou tão forte que se julgou livre para construir um muro, que pode transformar-se, como o de Berlim, no muro da vergonha. Arafat e Sharon pertencem a uma geração de extremistas. Arafat repousa na eternidade e será julgado por seus erros. Já Sharon está vivo, embora remanescente de um tempo de heróis e sangue. Israel é um país consolidado. Resta a criação do Estado palestino.


Enquanto isso, na Coréia do Norte, o presidente Kim Jong-il instituiu o penteado anticapitalista, socialista: curto, raspado. Os homens maiores de 50 anos podem ter de 7 cm.


Já o cabelo da Condoleezza, capitalista, é volumoso, laqueado e cheio de topetes.


 


Folha de São Paulo (São Paulo) 11/02/2005

Folha de São Paulo (São Paulo), 11/02/2005