A arte poética e a dificuldade da escrita
Os poetas bebem de fontes ainda não acessíveis à ciência. Freud remete à noção de conhecimento, saber e verdade transmitidos pela poesia.
Os poetas bebem de fontes ainda não acessíveis à ciência. Freud remete à noção de conhecimento, saber e verdade transmitidos pela poesia.
A aula sobre a narrativa proustiana transcorria normalmente via Googlemeet. A sala virtual cheia. Faltavam a algazarra dos alunos nos corredores da Faculdade de Letras, a coxinha e o pastel gordurosos engolidos às pressas no intervalo entre uma aula e outra, o papo politizado com os colegas e as discussões culturais e educacionais no cafezinho.
As vozes se exaltavam na roda de estudantes perto do trailer de cachorro-quente, no Fundão. É claro que todos ali juravam não mudar o seu voto em plena campanha eleitoral. Mas criticavam as mudanças de opinião política, as traições e as palavras não honradas pelos políticos brasileiros.
Não consigo saber se estou dormindo, se sonho, se é verdade, se imagino a vela bruxuleando, se apagando, tremendo, morrendo. O menino do mato está na minha frente, assim do nada, fala de Oxóssi, Jesus, Buda, Maomé, numa das mão o Corão, na outra a Torá, uma Bíblia ao lado, fala de indígenas, Nossa Senhora, choro, não acredito.
Os romancistas historiadores do presente cediam um pouco de espaço ao romance histórico, ou de extração histórica.
Mal saía da Galeria da Academia de Veneza. As imagens de Bosch nas retinas doíam, me arranhavam os olhos. O peito rasgado. Ratos, morcegos, inferno, anjos com asas negras, noite pictórica fechada. Escuridão quase total na tela do artista, assustador, pura arte, beleza machucada
A linguagem é reveladora de um meio e de uma ideologia pessoal. A lexicologia funciona desarticulando o vocábulo do enunciado (uma das suas fragilidades científicas, diminuída se se levar em conta associações e oposições), já a denominada sociolinguística prioriza a organização sintática, mais rica para um estudo sociológico
Carioca reativa sentidos esquecidos e aquece a memória de quem a lê.
O colega fazia conferência no Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ, no centro do Rio, no belo prédio construído nas primeiras décadas do século XIX, onde funcionou a Academia Real Militar. O IFCS vai tremer, me confidenciou ele, que chegou ao local junto comigo. Ele faria a conferência ao lado de um professor da Universidade de Berlim, um dos maiores militantes da causa gay na Europa, o colega precisou. Gênero, identidades e política o tema. O professor brasileiro abriu a conferência. Leu umas frase que me soaram conhecidas.
Como o poeta sem lar, abandonado, achincalhado por seu público, sem carinho, sem calor, o excluído, o desmancha-prazeres. Mas que revela ao mundo a imagem de quem o olha e lê: palhaço somos nós!
Os poetas pressentiram há muito tempo o que a psicanálise vai " descobrir" mais tarde, sussurrou uma Madame K. didática, brandindo o livro da Ana Maria Machado como uma arma.Prosa ou verso, literatura é arte, ainda acrescentou. Li A audácia dessa mulher, retruquei, para não ficar por baixo, mas ela nem ouviu.
Baudelaire já escreveu com mestria em Ideal o peso do tempo, “esse obscuro inimigo que nos corrói o coração”. Mas o poeta sabia muito bem que a arte, além da religião, logra neutralizar o tempo.
A ruptura do belo via comportamento pecaminoso é que, entendo, deve ser ressaltado. Daquele pecado – o escritor sofre tremendamente entre o desejo e a razão conservadora – nascerá uma nova estética e um novo modelo social?
O que ela ensinou em voz alta deixou todos pasmos: se tinha escarradeira nas casas cenário dos romances de Machado, vocês acham que não tinha um jeito de usá-las, bando de imbecis?
Sair do sufoco do engarrafamento asqueroso na Linha Vermelha e entrar no Campus da UFRJ é como a experiência da primeira visita a um quadro de Tintoretto na sua cidade, Veneza. O maravilhoso, a ciência, a arte