Em debate na última segunda feira na ABL, com a historiadora Heloisa Starling e o presidente da ABL, jornalista Merval Pereira para o lançamento do livro Direito de/Para todos, a ministra do STF Cármen Lúcia afirmou que a história da ABL mostra que o Brasil pode dar certo.
“A Academia é o Brasil que dá certo. É a demonstração de que o Brasil pode dar certo. Um grupo de pessoas se reúne, há 127 anos, imaginando que, se a França tinha uma academia de letras, nós podíamos ter. E hoje temos um Machado de Assis lido no mundo inteiro, a ABL continua e depois foi até modelo para a França, porque tivemos uma mulher na ABL – Rachel de Queiroz, antes de Marguerite Yourcenar na Academia Francesa.
Eu que vivo num mundo que não é exatamente o que dá mais certo, é um conforto estar num lugar que representa as possibilidades de o Brasil dar certo. O Brasil engole um elefante e se engasga com uma formiga com a maior facilidade. O Brasil tem a ABL, tem uma rede Sarah de hospitais que trata absolutamente igual o empresário mais importante e mais rico e a pessoa que esteja na rua sem atendimento.
O Brasil às vezes não consegue afastar um superintendente que tenha problemas na justiça. Consegue grandes feitos e não consegue no dia a dia o que é mais importante. O que me move é imaginar o que será o Brasil daqui a 200 anos. Tivemos um imperador que outorgou uma Constituição na qual, a despeito de tudo, tinha direitos, inclusive a liberdade de imprensa. Tivemos um judiciário que se constituiu alí e continuamos a ter um déficit democrático, carência democrática no Estado e na sociedade brasileira. Uma pesquisa de 2023 mostrou que os brasileiros se preocupavam com segurança pública em primeiro lugar, depois com trabalho, saúde, e educação em quarto lugar. E só se transforma pela educação e pelos livros.
A minha geração, que conseguiu brigar, pegar o que as outras gerações vinham trazendo de luta pela democracia, chegar aos anos 80 exuberantes para pensar e querer uma nova Constituição, um projeto de Brasil diferente com uma constituinte, e continuamos desigualados; o assassinato de mulheres e o mau trato de crianças estão no dia a dia. Um mundo que falava de paz em 1948 e chegamos a 2024 com a ONU dizendo que há 76 guerras ou conflitos – 56 estados com áreas de conflitos entre si.
Onde foi que a nossa geração errou, no sentido de não ter contado e convencido os jovens que liberdade não é uma palavra, é uma essência humana que cada um de nós tem, que está na ordem do dia de cada um de nós. Você desiguala o outro e se desumaniza e se distingue para pior. Quando falamos de justiça e direitos humanos não estamos falando retoricamente de nada e sim da vida de cada um de nós, do que já vivemos, do que estamos vivendo e do que queremos deixar para depois de nós. Porque não aprendemos com a história? Não somos capazes de realizar um Estado onde as pessoas se igualem na parte material, de liberdades, de educação.
Estamos numa sociedade que parece que o grande movimento é procurar ser infeliz e não sendo, pelo menos infernizar a vida do outro. , Estávamos isolados em 2020, pela pandemia, em 2022 por ódios que nos afastaram. Vamos chegar juntos desta vez? Não interessa de onde cada um veio, qual a opção de cada um, mas vamos chegar junto. Vamos abrir os braços pros outros e fazer um país.