Após 128 anos de existência da ABL, é a primeira vez que a casa de Machado de Assis recebe entre os acadêmicos uma mulher negra. Ana Maria Gonçalves, autora do livro ‘Um Defeito de Cor’, cuja narrativa aborda a história do povo negro e obteve grande destaque de público e critica, alcançando popularidade com a escola de samba Portela, onde foi tema do samba enredo, chega à cadeira 33.
A luta pela entrada de mulheres à Academia é histórica e remonta a temos idos, desde a primeira mulher Amélia Beviláqua que tal proposta fez em 1930, com recusa absoluta. Nada como tempo e a luta para mudar a história.
Em 1977 chega Rachel de Queiroz, 80 anos depois, abrindo novos horizontes tal este como Ana Maria o faz agora, senda a primeira negra neste espaço do pensamento. Fato que na prática não só faz justiça como abre outras perspectivas de pensamento e visão de mundo. Seguiram a Rachel outras notáveis mulheres, totalizando hoje seis mulheres. Tímida estatística.
Em seu discurso, Ana Maria, relembrou a importância e a força de sua família, em especial de seus pais, além dos amigos que a fizeram conquistar espaços e galgar horizontes com os quais batalhou e sonhou.
Com entusiasmo lembrou-se de seu antecessor o acadêmico Evanildo Bechara, nome singular da história lingüística brasileira, ocupante da cadeira 33, agora sua. Fez questão de ressaltar a relevância de seu legado, como a participação decisiva no novo acordo ortográfico, a publicação de 32 livros, mais de 100 artigos, verbetes, inúmeras resenhas como também sua generosidade e gentileza contumaz, que inclusive, posso testemunhar. Fez questão também de acentuar a responsabilidade desta ocupação. Usando o termo ‘pretoguês’ para expressar a língua que fala, causou certa polêmica nas redes sociais, mas certamente vale como afirmação do momento.
Foi recebida pela academia Lilia Schwarcz que relembrou a importância de sua entrada à ABL por tudo que significa, vindo com ela à representatividade negra. Não faltou o abraço caloroso dos novos colegas e acadêmicos Gilberto Gil na entrega do diploma e de Ana Maria Machado do colar.
A nova acadêmica recebeu seus convidados com um jantar que ressaltou a gastronomia afro-brasileira especialmente elaborada para a ocasião. Uma noite que entrou para história, não só da Academia Brasileira de Letras, mas também para a do Brasil que ainda carece de reparar brechas históricas e sociais.
Valendo lembrar que propositalmente ou não, visões equivocadas e embaçadas disfarçam que o patrono da Casa era um negro. Que bons ventos tragam Ana Maria Gonçalves à cadeira 33.
Matéria na íntegra: https://www.jornaldarepublicaonline.com.br/noticia/primeira-escritora-negra-chega-abl
12/11/2025