O Presidente da Academia Brasileira de Letras, Acadêmico Marcos Vinicios Vilaça, declarou que o Acadêmico Padre Fernando Bastos de Ávila, de 92 anos, falecido no dia 6 de novembro, em Belo Horizonte, às 5h, vítima de câncer, "enquanto teve condições, foi um confrade de grande assiduidade, uma presença muito importante na defesa da Doutrina Social da Igreja. Sucessor de D. Marcos Barbosa na cadeira nº 15, ele soube ser fiel ao espírito dos ensinamentos da Companhia de Jesus".
O Acadêmico morreu na manhã do dia 6 de novembro, em Belo Horizonte, na Casa de Saúde Irmão Luciano Brandão.
Sexto ocupante da Cadeira nº 15, eleito em 14 de agosto de 1997, na sucessão de Dom Marcos Barbosa, Padre Ávila foi recebido em 12 de novembro de 1997 pelo Acadêmico Alberto Venancio Filho.
A Sessão de Saudade será realizada na quinta-feira, dia 11 de novembro. Ao final, será declarada vaga a cadeira nº 15.
Presença na ABL
Padre Fernando Bastos de Ávila, S.J. nasceu no bairro de Copacabana, Rio de Janeiro (RJ), a 17 de março de 1918. Filho do professor José Bastos de Ávila e de D. Cinira Muniz Freire Bastos de Ávila. Fez o curso primário na Escola Sarmiento, da rede pública do então Distrito Federal. Iniciou o curso secundário no Colégio Santo Inácio. Ingressou, em 1930, na Escola Apostólica dos Padres Jesuítas, de Nova Friburgo, preparando-se para ingressar no noviciado da Companhia de Jesus, na qual entrou em 1935. Ali fez cursos de Humanidades, Retórica e Filosofia Escolástica, iniciando sua formação jesuítica, regulamentada pela célebre Ratio Studiorum.
No triênio de 1943-45, foi incumbido de ministrar o curso de Retórica, com base nos grandes clássicos gregos e latinos.
Em 1945, após o término da guerra, segue para Roma, com o Pe. Henrique Lima Vaz e o Pe. João Bosco Penido Burnier, para concluir o mestrado em Filosofia e Teologia na Universidade Gregoriana, e desde então uma profunda amizade uniu os três jesuítas. Em Roma, recebe a ordenação sacerdotal, em 1948. De 1950 a 1954, fez o doutorado em Ciências Políticas e Sociais na Universidade de Louvain (Bélgica), defendendo a tese L’Immigration au Brésil, aprovada com “la plus haute distinction”. Quando publicou seu primeiro trabalho sobre o problema das migrações, mal fazia idéia da gravidade que o problema assumiria, inclusive na Europa. A seguir, realiza estágios na França, sob a orientação dos professores Alfred Sauvy e Jean Forastié.
De volta ao Brasil, em 1954, ingressa no corpo docente da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, num magistério que se prolonga até hoje, ensinando em várias unidades Sociologia, Ética e Doutrina Social da Igreja. Em 1955 criou, na mesma Universidade, a Escola de Sociologia, Política e Economia, do qual foi diretor até 1967. Nela, durante 16 anos, dedicou-se ao ensino de Introdução às Ciências Sociais e de Doutrina Social da Igreja. A Escola do Padre Ávila, como era chamada, formou uma geração de cientistas sociais que têm se destacado nos meios universitários e acadêmicos.
Foi nesta época que lançou a revista Síntese Política, Econômica e Social – em acróstico, SPES –, cujos editoriais redigia, revista que, em dez anos, publicou quarenta números, com ampla penetração dentro e fora do âmbito universitário. Ela continua a ser publicada como Síntese – Nova Fase, pelo Instituto Santo Inácio, de Belo Horizonte.
Em 1964, foi nomeado vice-reitor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, quando se empenhou, com Evaristo de Moraes Filho e Djacir Menezes, na luta pelo reconhecimento da profissão de sociólogo, que veio a ser aprovado, pelo Ministério da Educação e Cultura. Em 1969, fez parte do grupo que preparou o projeto de reforma universitária.
Em 1965, o Governo Federal introduziu no currículo da escola secundária a cadeira de Moral e Civismo. Pe. Ávila foi indicado para preparar livro-texto da disciplina. Com a colaboração de uma equipe de trabalho e de especialistas, organizou a Pequena Enciclopédia de Moral e Civismo, publicada em 1967. O volume foi considerado subversivo, e por isso foi apreendido. Voltou a ser reeditado em 1972, por iniciativa dos Ministros Jarbas Passarinho e Nei Braga, seguindo-se várias reimpressões.
Em 1967, criou-se o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento – IBRADES, à semelhança da instituição congênere Instituto Latino-Americano de Desenvolvimento – ILADES, com sede em Santiago do Chile. No ano seguinte, Pe. Ávila foi nomeado primeiro diretor da instituição, destinada a assessorar a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB. Como assessor da CNBB elaborou, durante vários anos, análise sobre a situação política e social do país. A sua coerência e independência na condução dessas atividades levaram-no a interrogatório no Inquérito Policial Militar.
Na mesma época, teve a possibilidade de empreender uma pesquisa sobre a participação do clero no Parlamento brasileiro. Este trabalho, que duraria dez anos, só foi possível graças à colaboração da Fundação Casa de Rui Barbosa, que lhe permitiu o acesso fácil à inestimável coleção dos 176 volumes dos Anais do Parlamento brasileiro.
Outro tema a que se dedicou, em sua atividade acadêmica, foi a pesquisa sobre a formação e a difusão da Doutrina Social da Igreja. Teve a oportunidade de consultar a biblioteca da instituição Action Populaire, dos Jesuítas de Paris. A pesquisa resultou na obra Pensamento Social Cristão antes de Marx (1972), onde expressa a convicção de que os graves problemas criados pela Revolução Industrial e responsáveis pela chamada questão social tinham sido objeto das atenções da Igreja bem antes de Karl Marx pretender solucioná-los pela luta de classes. Atendendo a uma solicitação da Conferência Episcopal Latino-americana – CELAM, trabalhou, em colaboração com o Pe. Pierre Bigot S.J., na preparação de um livro de difusão da Doutrina social da Igreja e de suas propostas de solução dos problemas socioeconômicos da América Latina.
A sua capacidade de ação estendeu-se a várias instituições. Foi o inspirador da Associação dos Dirigentes Cristãos de Empresas, membro da diretoria do Instituto de Estudos Políticos e Sociais – IEPES. Integra o Conselho Técnico da Confederação Nacional do Comércio, onde tem proferido conferências sobre os problemas sociais brasileiros. Em 1978, organizou para a Arquidiocese do Rio de Janeiro o Departamento de Pastoral da Cultura, promovendo reuniões de intelectuais, além de fazer a conferência introdutória em 41 Encontros de Líderes com Poder Decisório, no Sumaré.
Por ocasião do centenário da encíclica Rerum novarum, de Leão XIII (1891), Pe. Ávila preparou a Pequena Enciclopédia de Doutrina Social da Igreja, redigindo a maioria dos verbetes, com base na Enciclopédia de Moral e Civismo e o Katoliches social Lexicon.
Na sua atividade de ensino em nível de graduação e pós-graduação, pôde colaborar na preparação de várias teses de mestrado e doutorado. Aposentou-se em 1995, após 40 anos de exercício do magistério.
A sua posse na Academia transcorreu no ano do quadricentenário da morte de José de Anchieta e tricentenário da morte de Antônio Vieira, dois jesuítas que escreveram páginas memoráveis da História do Brasil. O seu ingresso na Academia representa a ligação feliz dos feitos da Companhia de Jesus no panorama brasileiro e a sua contribuição à cultura de nosso país. Como sacerdote, assumiu a liturgia fúnebre dos acadêmicos falecidos.
A obra de Pe. Ávila – quinze livros publicados e numerosos ensaios, artigos e conferências – pode ser classificada em sociologia teórica, problemas brasileiros, história e doutrina social da Igreja.
Foi membro da Comissão de preparação do Anteprojeto de Código Penitenciário, código elaborado e publicado em 1957; membro da Comissão Provisória de Estudos Constitucionais nomeado pela Presidência da República, em 1986; membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (desde 1995).
Faz parte do Conselho Técnico da Confederação Nacional do Comércio, de cuja revista, Carta Mensal, é colaborador. Em 1990, foi nomeado pelo Papa João Paulo II membro da Comissão Pontifícia de Justiça e Paz, da qual é um dos relatores, reconduzido para o cargo em 1996.
6/11/2010
05/11/2010 - Atualizada em 05/11/2010